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Publicado: 04 de outubro de 2025 às 09:24

Reforma administrativa: por que servidores estão preocupados

Para servidores públicos e entidades sindicais, a novidade reacendeu preocupações que não desapareceram desde a tramitação da PEC 32/20.

A reforma administrativa voltou a ser pauta central na política nacional com a divulgação do relatório final do Grupo de Trabalho da Câmara dos Deputados. Para servidores públicos e entidades sindicais, a novidade reacendeu preocupações que não desapareceram desde a tramitação da PEC 32/20.

Apesar de o relatório falar em modernização e eficiência, muitos funcionários veem risco de enfraquecimento do Estado. Assembleias, congressos e encontros sindicais destacam pontos como a precarização das carreiras, a perda gradual de direitos e a transferência de políticas públicas essenciais para arranjos privados.

Advogados que atuam em defesa do funcionalismo apontam dois passos importantes antes de qualquer análise jurídica: mapear os receios dos servidores como parte de uma disputa sobre o modelo de Estado e confrontar essas preocupações com o relatório do GT, para entender se foram ignoradas, acolhidas ou distorcidas.

Estrutura do relatório

O documento se organiza em quatro eixos:

  1. Estratégia, Governança e Gestão – Foca em planejamento estratégico, acordos de resultados, bônus por desempenho e maior fiscalização pelos tribunais de contas.
  2. Transformação Digital – Visa digitalizar serviços e criar plataformas eletrônicas de atendimento.
  3. Profissionalização do Serviço Público – Propõe reorganização de carreiras, novo estágio probatório, tabela unificada de remuneração e concurso nacional unificado.
  4. Extinção de Privilégios – Busca revisar benefícios internos considerados excessivos, como férias de 60 dias e adicionais de tempo de serviço.

O discurso oficial defende que a reforma pretende tornar o serviço público mais eficiente e voltado ao cidadão. Mas servidores e entidades veem a modernização como uma ameaça à estabilidade e à proteção do interesse público.

Modernização ou precarização?

Sindicalistas afirmam que a reforma transforma o Estado em mero financiador de serviços, com execução entregue a contratos temporários, organizações sociais e terceirizados. O relatório do GT, em trechos sobre profissionalização, confirma esse movimento ao detalhar novas regras para temporários, expansão de vínculos precários e reorganização de carreiras com mobilidade forçada.

O receio é que a lógica fiscal e de metas passe a prevalecer sobre a manutenção de estruturas públicas sólidas. Para servidores, medidas como avaliação de desempenho e bônus por resultados podem gerar sobrecarga, assédio institucional e adoecimento organizacional.

A narrativa pública e a realidade do funcionalismo

A narrativa oficial enfatiza o fim de privilégios e a redução de custos, muitas vezes usando casos extremos para justificar mudanças amplas. Na prática, a maioria dos servidores recebe salários médios e trabalha sob condições de sobrecarga, sem os supostos “benefícios exagerados” citados no discurso público.

O relatório menciona explicitamente alguns privilégios, mas associa estabilidade e benefícios a regras de desempenho, reforçando a percepção de que a reforma amplia a pressão sobre todos os servidores, e não apenas sobre casos isolados.

Flexibilização e mercantilização

Os servidores alertam para a crescente flexibilização do vínculo público, expansão de contratações temporárias e reorganização de carreiras em blocos transversais. O relatório prevê mobilidade obrigatória, vínculos estatutários temporários e incentivo à transversalidade, confirmando parte das críticas: a reforma substitui gradualmente a estabilidade e as carreiras duradouras por contratos mais frágeis.

O teletrabalho também é citado como instrumento de economia e digitalização, mas sem contrapartidas financeiras, o que pode gerar sobrecarga e redução indireta da remuneração.

Estabilidade como proteção do interesse público

Para servidores, a estabilidade garante autonomia, continuidade e proteção contra pressões políticas. O relatório, porém, condiciona essa estabilidade à avaliação de desempenho, transformando um direito protetivo em privilégio condicional, alinhado a metas de produtividade.

Conclusão

A percepção do funcionalismo é clara: embora apresentada como modernização, a reforma administrativa pode fragilizar o Estado, precarizar carreiras e deslocar a lógica do serviço público para a eficiência fiscal e metas de produtividade. O desafio, agora, é avaliar se essas mudanças de fato alcançam o equilíbrio entre eficiência e proteção do interesse público — ou se confirmam os temores de que o Estado social está sendo gradualmente desmontado.

Fonte: mapaempresariall.com.br